quarta-feira, 9 de março de 2011

Breve pouso na realidade



Eu estava acordada mais uma vez naquela cidade estranha a quilômetros de distância de um passado a qual eu pretendia enterrar, mas que por vezes me perseguia em meus sonhos. Naquela manhã não seria diferente. Acordei e os ovos fritos e torrada sorriam para mim, em um convite direto para que me banqueteasse e me alegrasse com eles, que deixasse minha tristeza e saudade irem embora, mas em minha primeira mordida no café da manhã, o meu pesadelo de todas as noites acontece. Agora trêmula com uma carta assinada por meu primo Austin em mãos tentava conter o choro e a ânsia de vômito que aquela sensação de ter engolido uma bola de golf me causava. Naquele dia mais cedo morreu o meu pai, era o que dizia a carta, e eu rezava em silêncio para que esta não passasse de uma brincadeira de mau gosto do Austin. Mas não era, eu conseguia notar a sua ortografia manchada por lágrimas em cada parágrafo. Resolvi não chorar, e me vestir novamente com a maturidade que há anos me fugira.
Peguei o primeiro avião em direção a Porto Alegre, vestia uma roupa qualquer, queria me sentir como eu mesma durante as duas horas de vôo seguintes, para então deixar minha antiga vida para traz e despertar para o mundo real, desta só levaria duas mudas de roupa e um cd do One republic, e ao som de come home continuei sentada ao lado daquele estranho que vez ou outra me observava. Pude notar tristemente a semelhança daquela música com a minha vida, aquela vida que passei a viver desde o começo do dia. E as lágrimas ameaçavam cair. Fui ao lavatório e refleti, vi que aquele era o momento para crescer. Troquei então de roupa, não que soubesse como me vestir para um enterro. Pus um tailleur preto e me preparei psicologicamente para os passos seguintes.
Ao voltar para o assento, pude notar o olhar curioso e diferente daquele rapaz, um olhar reprovador. O rapaz ao meu lado não me reconhecia, nem eu me reconhecia. As lágrimas então vieram à tona, como vingança por todo o tempo que as deixei presas, um choro desesperador, onde a saudade e a angústia falavam por mim. Então era verdade, tudo acabara como no pesadelo, Ele partiu sem que conseguisse me despedir, não disse o quanto sentia sua falta, o quanto o amava.
O rapaz ao meu lado assustado com toda aquela cena tinha um olhar diferente dessa vez, um olhar reconfortante, como o que vi várias vezes em minha infância, aquele que fala sem formar frases “vai ficar tudo bem querida, não tenha pressa” e então me senti melhor em saber que Ele não se foi pra sempre, estaria presente em todos aqueles olhares. Pedi desculpa e fui novamente ao lavatório. Troquei de roupa. Não estou preparada para essa triste realidade, não por enquanto. De cabelo despenteado e roupa qualquer o que mais precisava naquele momento era de um abraço e um pote de sorvete de flocos. Não me interpretem errado, não iria naquele enterro, já havia tentado enterrar o meu passado, enterrar o meu pai seria tarefa difícil de mais para mim, não sou tão forte, e nem tão corajosa, não cresci o suficiente. Prefiro assim, manter a boa imagem que tinha do meu querido pai, um senhor sorridente que sempre me dizia: “Sem pressa, somente você conhece o seu momento”.

2 comentários:

Manuella Braga disse...

Um texto que me chamou atenção, pois gosto de textos grandes, e principalmente com conteúdo.
Não podemos fugir das lembranças, mesmo indo pra lugares a quilometros de distância, elas virão junto conosco. Mas poderemos sim, deixa-las para trás. A última frase "Sem pressa, somente você conhece o seu momento” me fez refletir, e eu espero que eu conheça o meu momento, e que não demore muito.
Parabéns, teu blog é realmente muito interessante.
Eu sou Manuella Braga e infelizmente somente agora estou conhecendo teu blog, pois me ausentei do meu durante alguns meses, mas pode ter certeza, que ganhou uma leitora fiel!
Se poder, http://manuellabrg.blogspot.com
Beijos e boa sorte!

Firefly disse...

É um prazer receber um comentário seu Mannu, e fico feliz que tenha gostado do texto. Seja bem vinda!
Estou seguindo.